Vertiginoso
Um arrepio subiu pela nuca quando sentiu a mão fria entre suas coxas quentes. Não tirou. Ajeitou para que ela se sentisse convidada. Gostava daquela sensação. Pensava que as pedras do quebra-mar, sob o sol arregalado, sentiam assim quando a maré subia e as primeiras ondas quebravam ali. Sentiu o arrepio se estendendo pelo corpo. Agora já pensava que assim se sentiam os gatos, na primeira espreguiçada da manhã. Quase amoleceu, mas uma leve pressão dos dedos fez com que ficasse alerta, acendeu os sentidos.
A noite estava fresca, podiam ir caminhando, era perto, mas uma urgência se fez. Foram de táxi, essa coisa meio retrô e sempre (ou quase sempre) disponível. Lembrou de um fim de tarde em Porto Alegre, quando caiu o céu. Saía de uma reunião e não havia meio de voltar ao hotel, nenhum táxi, nenhum Uber, nenhum 99, nada! Depois da raiva inicial, a frustração com a roupa grudada ao corpo de tão molhada, seguiu andando até conseguir um carro, metade do caminho, quase. Banho quente, vinho e cama. Mas hoje a noite estava amena.
Só um lance de escadas para subir, nunca quisera um andar muito alto. Chave na mão. Não buscou o interruptor. Sapatos na sala, roupas pelo corredor e, num puxão de colcha, cama pronta para acolher seus corpos. Esses mesmos que vinham se pegando, apertando, beijando desde a calçada. A respiração pesada entre o ombro e o ouvido era excitante. A puxada do quadril, os dedos buscando caminhos, a língua percorrendo suas reentrâncias.
Com treinada sincronicidade, anteviu o enevoar dos sentidos. Tudo era movimento preciso, intenso, firme. O movimento do som, sincopado. Resfolegante e gutural. A boca salgada, os olhos cerrados, perdidos de si. Tudo era crescente, uma escalada desesperada e virtuosa, rumo ao ápice. A proximidade do apogeu se pressentia nos detalhes, um jeito de por as mãos nas costas, a força das pernas indecisas entre resistir e sucumbir, o arco do peito expandido, os dentes, o grito. Podia entender a supernova com absoluta clareza nesse exato momento. Mais do que isso, era capaz de detalhar as ondas da explosão e a agonia da destruição, a extensão, não. Esta só depois, quando a intensidade do brilho se revelasse, uns segundos depois, uma eternidade fugaz.
Enfim, o torpor. Todo o movimento cessa, acalma-se a alma. Amansa-se a respiração. Uma vaga lembrança atravessa o pensamento, “Larga o meu peito/ Solta-se no espaço”, dá-se conta da sede, mas não se move. Será que trancou a porta?
Qdo o bicho escrivinhador se solta, pega geral.
ResponderExcluirMaravilhoso, tia. Eu espero que os efeitos do bicho escrevinhador demorem em você. Adoro ler suas imagens.
ResponderExcluirMeninas que me enchem de alegria numa tarde chuvosa
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