Marítimo
Naquela tarde, enquanto cochilava no sofá, sonhou com o mar. Acordou nostálgica. Sentia a maresia na pele, o gosto do sal na boca, ouvia o marulho. O desejo profundo de entrar no mar fazia ainda mais incômodo o calor, pensava na água quase fria, sentia o arrepio. Naquela tarde, entre o sonho e o saber-se sonhando, queria o abraço do mar, mas acordou antes de mergulhar.
Ah, o mar...
Quando aprendeu que o infinito tem começo e não tem fim, não conseguia achar um uma coisa infinita. Era abstrato demais, afinal, tudo tinha um fim. A grandeza do infinito era improvável, pensou assim por muito tempo, mas seguia procurando, intimamente, uma coisa infinita. Infinito: que não tem fim.
Num lampejo de lucidez, concluiu que o movimento do mar era infinito. Pôs-se à prova muitas vezes e ficou satisfeita quando não conseguiu vencer-se, seu exemplo de infinito era o movimento do mar. O movimento do mar não tem fim. Aquela conclusão a satisfez de muitas maneiras, mas a melhor foi pensar que o mar, mesmo sendo finito, continha uma grandeza infinita. Essa subversão da lógica a divertia.
Se pensasse mais, talvez encontrasse outros infinitos, porém esse lhe bastava. De repente o infinito era uma grandeza plausível. Mais que isso, era certa e conhecida. De inatingível, o infinito passou à palpável. Estreitou sua relação com o mar, tinham a intimidade de quem compartilha um segredo, a cumplicidade dos velhos amigos.
Naquela tarde sonhou com o velho amigo e sentiu saudade. A boca salgada, os cabelos impregnados de maresia, o corpo entregue ao infinito. De olhos fechados embalava seu cansaço naquele marulho incessante, “dorme, querida, descansa seu ser aflito e extenuado, dorme que vim te abraçar”. Então, despertou, antes de entrar no mar...
Ah, o mar.
Ah, esse mar. Que ideia linda do mar como infinito palpável.
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