Com a luz apagada ou no claro do dia

 

 

Não, meu bem, eu não o amo todos os dias. Há dias em que te odeio e essa é a nossa sorte. Há dias em que tenho vontade de lhe matar, não aos poucos, não sem violência. Há dias em que sou capaz de qualquer violência, duvida?

Não, meu bem, eu não o amo todos os dias. Há dias em que sinto só ternura, vontade de lhe cuidar, proteger do mundo, de si mesmo. Há dias que sou capaz de enormes delicadezas. Há dias de grandezas naturais e harmônicas, já percebeu?

Não, meu bem, eu não o amo todos os dias. Há dias em que sinto desprezo ou indiferença e isso nos salva. Há dias em que desejo não estar com você, embora não vá lhe deixar definitivamente. Há dias em que é melhor sair de cena, você não acha?

Não, meu bem, eu não o amo todos os dias. Há dias em que só tenho tesão e isso é ótimo. Há dias em que quero só sexo, das posições mais óbvias às inusitadas variações do Kama Sutra, pode até ser com você, e isso é o que nos liberta. Há dias que quero essa doce exaustão, você não?

Não, meu bem, eu não o amo todos os dias. Há dias em que só há irritação e isso nos protege. Há dias em sua voz me enerva e, então, paro de lhe ouvir. Há dias que quero lhe calar, não soltando um “cale-se”, mas pondo a mão em sua boca, cobrindo-a, abafando seu som. Acredita?

Não, meu bem, eu não o amo todos os dias. Há dias que não o amo e essa é a verdade que nos torna cúmplices. É claro que eu sei, você tampouco me ama todos os dias e isso é o que nos redime –a certeza que não precisamos amar todos os dias nos apazigua. Pensou nisso?

 

Comentários

Postar um comentário

(Saber o que o outro pensa, faz diferença...)