A Lua que esperançava
Lá do infinito tudo via. A moça
que caminha na esquina com roupa colorida e sorriso fácil lhe parece às vezes
triste. O homem que para o carro para a moça entrar, arrota um poder que só
carrega no bolso, no fundo dos brios é solitário. A enfermeira que chega do
hospital esgotada lhe parece mais sofrida que de costume, mal sabe ela que a
morte não tem dono ou dona, é livre e faz o que quer e bem entende. A garota
que sai da faculdade tem medo do homem que aparece na rua escura. Ela não entende
por que mulheres vivem com medo. O jovem que dorme na praça estende seu papelão
e parece paquerar com ela. Ele a vê em sua inteireza, sente-se tímida por
aquela invasão. Ele lhe pede ajuda, está cansado de dormir na rua. Ela não tem
esse poder. Sente-se impotente. Perde-se em pensamento quando vê o carro em
alta velocidade ultrapassar as luzes vermelhas. Desde quando ela lembra de sua
existência sempre que essas luzes vermelhas são ignoradas coisas tristes
acontecem e lá está mais uma vez corpos espalhados, sangue, dor, lágrimas e o
descanso da enfermeira é interrompido. Parece que esses seres nunca aprendem.
Cansou-se da cena de dor tão repetitiva. Correu seu olhar pelos lares. Crianças
brincando na rua rindo da vida. Ah! Isso que era bom de se ver! Mulheres
jogando buraco e falando mal dos seus maridos e rindo de suas dores e delícias.
Homens assistindo futebol e ora odiando, ora amando, risos, bebidas, comidas.
Alguns lares eram tristes, jovens nos quartos com o rosto enfiado num quadrado,
mães que choram a solidão rimando com a traição, homens que pagam a garota da
esquina com roupa colorida. Crianças violadas, idosos espancados ou
simplesmente abandonados. A vida vista dali de cima muitas vezes a deixava
triste e ela resolvia diminuir, minguava e se escondia, e ficava num canto onde
não podia ser vista, não queria que lhe vissem chorando. De lá, vez em quando
dava uma espiadinha pois sentia saudade do riso das crianças e das gargalhadas
que ecoavam dos jogos de buraco. Também gostava de bisbilhotar as maternidades,
via tristeza por lá também, bebês que não eram benvindos, bebês que D. Morte
levava antes mesmo de nascer, mas ali havia uma força que sempre a fazia
crescer. Uma luta pela vida, uma pulsão de vir ao mundo que a enchia de
alegria. E ela os perdoava por seus diferentes modos de morrer, só para poder
vê-los nascer e a vida se encher de esperança mais uma vez.
Q lua linda! Bela imagem, mas devo confessar q, mtas vezes, acho a esperança opressora...
ResponderExcluir"um poder que só cabe no bolso" e "seus diferentes modos de morrer" são ideias (imagens?) que irei carregar desse texto. Muito bom!
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