Antipoética

Tenho natureza antipoética.

Não sei as regras,

Repito palavras,

Pulo linhas ao acaso,

Desde a escola, não conto sílabas.

 

Falta-me a sensibilidade fundamental para ler.

Gosto de uns clássicos por pura sorte

Não sei bem o que dizem,

Mergulho em alguns de seus poemas – sim, só alguns! – como se fossem uma piscina:

Uso boias!

Fico molhada de suas ideias e logo estou enxuta.

Outros nomes consagrados da literatura mundial nada despertam em mim

Acho que requerem nadadores profissionais.

 

Há pouco tempo, minha antipoesia vomitou.

Quis ser o avesso de si.

Me obrigou a sentar em frente de folhas vazias.

Obedeci desconfiada.

 

Não temi a falta de imaginação.

Enxergo o fantástico do universo.

Não consigo tocá-lo ou traduzi-lo,

Rabisco-o com a incompetência que me é própria.

 

Com a parca linguagem que tenho,

Faço textos sem melodia.

Minhas raras rimas são pobres

Ou de classe média

No máximo, fingem-se de ricas com vocábulos de empréstimo.

 

Relevando meu intenso amadorismo,

Algumas pessoas leem meus garranchos

- A amizade é um tipo de cegueira carinhosa que nos permite estar juntos –

Certos dias, quase acredito ser poemista.

 

Minha língua seca,

Meu vocabulário estreito,

Minha ausência de método,

Tudo isso me impede de construir piscinas, lagos e mares.

Faço poças de cuspe.

 

No sertão que é esse mundo,

Quem consegue cuspir com as palavras se arroga direitos poéticos.

Eu até pediria perdão,

Mas ainda não estou arrependida de meus crimes.

Faço poesias antipoéticas.

Esse paradoxo é o que há de mais poético em mim.

 

 

 

Comentários

  1. Adoro sua teimosia e falta de escrúpulos (?) e cuidado para entrar nessas águas fundas ou rasas, não importa, desde q não saias seca.

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  2. Sua linda. amei demais...

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  3. A poesia se dobrando sobre si mesma. O jeito de ser poesia Rita Gomes. :)

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  4. ❤️ só agora lendo esses comentários!!

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