Vestes
Vestia
trapos. Tinha uma fascinação por roupas rotas. O tecido puído quase a se
desfazer lhe lembrava que o tempo tornava transparente as coisas. As pessoas,
infelizmente, não eram feitas dessa mesma fábrica. Algumas eram opacas até o
fim de seus dias, passassem quantos anos passassem. Ela já tinha suas
transparências. Não raro, pegava-se fulminando com os olhos uma idiotice
qualquer de conhecidos ou desconhecidos. Como suas vestimentas preferidas,
tinha buracos. Sinais das traças que lhe roeram a camada mais evidente da pele.
A vida tem pele. Por isso, a secura era tão arriscada. As vidas secas nem
sempre estão no sertão. Mesmo junto ao maior manancial, era possível
ressequir-se. A pele da vida é um bicho engraçado, cheio de peculiaridades.
Depois que seca, não adianta molhar. É preciso paciência e material correto.
Cada qual mais difícil. Ela sabia. Tinha pouca paciência. Talvez tivesse a seu
alcance o material. Mas, de que adianta ter o que não se tem paciência de usar.
Havia dias que queria secar por completo, padecer de combustão espontânea de
tanta secura. Havia dias. Havia dias. Até hoje, ainda havia dias. Despiu-se de
suas roupas caseiras. Tomou uma ducha. Colocou o vestido vermelho vivo
impecável e convidativo para os pecadores. Escolheu as grandes argolas
prateadas e o colar chamativo que agarrava o olhar dos desavisados para seu
colo frondoso. A pele da vida ainda era seca. Ninguém diria.
Gente, eu me senti nesse vestido, até por que tenho um, assim vermelho sangue e a pele está bem seca. Eu me achei nesse texto.
ResponderExcluirRoupa puída, pele puída, bem-vinda transparência! O pós-banho é tentador, mas revelador mesmo é o pré-banho... rsrs
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