A cor da história

 

Parecia só mais um lanche da tarde, mas aquele estava especial naquele dia. Pé de moleque com café me contaria histórias. Feito com carimã, rapadura preta, cravo, erva doce e castanha de caju, um pedaço de bolo continha tanta história. Sentei-me olhando para ele e o café e os ouvi. Por trás do bolo havia a mandioca, que tinha vergonha de sua pele branca e por isso se deixava enterrar para ficar marronzinha e ser aceita pelo povo da tribo. Depois de descascada era tão útil que eles não ousavam expulsa-la da aldeia. A rapadura, carregava o sangue dos escravizados nas costas por que a cana que lhe dava origem cortava as costas dos pobrezinhos, mas eles a perdoavam por que sua doçura lhes melhorava os dias áridos de amor e justiça, o cravo e a erva-doce eram os estrangeiros, mas de tanto que foram usados acabaram se sentindo de família. Assim o pé de moleque vem carregando as marcas nativas e as estrangeiras, sendo ele mesmo um forasteiro acabou por ter a cara da festa do mês de junho e a cor do pé do moleque que corre na aldeia e salta no rio. O café ouvindo tudo, não se fez de rogado, lamentou que sua cor lembrasse as almas escravizadas e mortas entre os cafezais, porém ciente do seu poder quando o sol descamba na montanha e seu cheiro sobe é sinal de que a vida sempre se renova ao amanhecer.

Comentários

  1. Amei! E olha que nem de pé de moleque eu gosto (a culpa, nesse caso, é dos estrangeiros).

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  2. Que a vida sempre se renove, como o cheiro do café nos renova!

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