O retrato


Olhou a fotografia antiga e reviu tantos amores que agora eram dessabores. Passou uma manhã inteira nisso. Folheando álbuns antigos. Uma foto a fez demorar-se mais. Achou-se bonita, mas desconfiou do sorrisão aberto. Recobrou a memória sobre como teria sido aquele dia. Poses de foto precisam ser contextualizadas, algumas são sorrisos só para tolos creem. Naquele dia, naquela foto em especial, ela parecia mais tudo, leve, alegre, parecia até que o sorriso não foi para a foto, mas é que não conseguia parar de sorrir. Estava ao lado dela, sua namorada “para sempre”. A família toda reunida e o amor delas revelado ali em público era algo para rir para sempre, mas não foi bem assim. O amor da amante passou rápido e ao lembrar daquilo sentiu o amargor do desamor, sentiu-se ridícula por rir daquela forma. Se pudesse voltaria ao passado para sorrir de forma tosca e avisá-la no futuro que aquilo não valeria à pena. Avisar no futuro que aquela fotografia na verdade era um túmulo, ali jaz um grande amor. Odiou-se por ter amado tanto alguém que era tão pouco. Era uma vergonha ter se doado tanto. Sua melhor amiga diria, “mas o importante é que você viveu isso”. Não queria ter vivido isso, se era para aprender a viver sem. É como doce, se não o conhecêssemos o café nunca seria sentido amargo, tudo culpa do açúcar. Malditos inventores de açucares e amores e fotografias que guardam os doces que amargaram. Largou os álbuns e saiu para dançar.

Comentários

  1. Adorei! Que a gente pode com todos os malditos com dança.

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  2. Ah, essas fotos... Dançar para seguir!

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(Saber o que o outro pensa, faz diferença...)